Essa semana eu dei-me a contemplar meu corpo. Não notei nada diferente, os mesmos olhos ligeiramente orientais, de beleza insípida e profundidade preocupante, os mesmos cabelos, tratados a base de desças e indiferença, e a mesma pele, que a dezoito anos figura dissonante do calor tropical, fulgurando em uma insistente alvura de quase duas décadas.
Espere, a pele mudou, Agora sinto nela queimaduras invisíveis, que ardem não ao toque da minha mão, mas do meu pensamento. Queimaduras ultra-violetas causadas por me atrever a chegar perto demais do amor.
Ícaro também partilhou desse ardente lirismo. Ícaro (foto acima), era filho de um inventado inventor grego chamado Dédalo. Dédalo foi certa vez contratado pelo rei Minos para construir o famoso labirinto do minotauro, mas depois de concluída a obra, foi encerrado com seu filho em uma torre para não mais saírem. Arquetipicamente arquiteto, Dédalo construiu um par de asas de cera para fugirem voando, avisando antes ao seu filho para não voar muito alto durante o caminho, pois o calor do sol derreteria a cera e ele cairia.
O que aconteceu foi que Ícaro ouviu os avisos do pai, porem, durante seu vôo, ousou olhar para o sol, apaixonando-se assim por Apolo, o deus regente desse astro. Levado cada vez mais pela loucura dos amantes, voou cada vez mais ao encontro do seu par, o que fez suas asas derreterem, sua pele encher-se de queimaduras dolorosas, mas em seguida esfriarem-se, pois caiu no mar, local de sua morte.
O poema abaixo faz menção as ardentes provas greco-brasileiras de que o amor está longe demais.
"PURAS QUEIMADURAS
Sim, eu vi o sol
Sim, eu mordi o anzol.
Sim, mas não foi sem preço,
Olhem minhas feridas, elas são o troco do meu apreço.
Não, eu não quero mais,
Não, voar queima demais.Te olhar de novo é coisa que não faço. Jamais.
Vou procurar uma donzela,
E seguir o conselho de meus pais.
Bobagem, voarei sempre que tiver corpo e cera
Bobagem, não sou oco, vou dar aos meus amores pura seda.
Verdade, tudo o que tive até agora foi pura vaidade,
Verdade, meu par é o sol, e entre nós não cabe a amizade."